sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

à espera do amanhã

Eu queria conseguir ver a vida com essa leveza de alma, de quem não tem o tique taque do mundo pulsando em si. Eu fecho os olhos e não me sai da cabeça o último suspiro, cadenciado e dolorido, de quem vê a morte nos olhos.
A minha dor vem das marcas de expressão da pele pendente que enegrece o teu rosto, xis.
Tento me convencer de que tudo advém do meu puro imaginário, mas é amarga a sensação de verossimilhança. Mundo louco que nos mete uma algema além do primeiro berro. Tique-taque insuportável beirando o caos – de agora, de daqui a pouco e até já.
Nem se eu conseguisse olhar através, eu poderia.. nem se fosse de uma tez demasiadamente menos acentuada..

Me doem todos os cheiros daquela casa, e sensação fria da cerâmica embaixo dos pés. Eu lembro do cutucar dos dedos roídos na pedra de musgo da entrada e me queimam as entranhas numa cólica acentuada de vazio.
Percebo os sonhos que tive há dez anos, percebo o meu rosto no espelho daquela mesma porta, num sextavado de desentrave, e me corroem os segundos. O presépio de todos os anos aguardando a minha presença, esperançoso, esse ano será só mais meia dúzia de gesso esquecido. E a clareira da escada, que já fiz de esconderijo, hoje, uma fresta mal apagada. Bolas de todas as cores me enfeitam a memória, recheadas de doces que seriam meus ao fim da festa – eu já sabia,a surpresa era ver aquele riso nascer no seu rosto sisudo. Não tenho muito a dizer do que me mata fio a fio nessa teia de dor e desamparo. Mas temo a sua ida, meu querido. E eu temo a sua volta.
Espero o que se espera do já não inesperado (dos que sabem, tu, Deus e o algo que me habita), e sei que essa promessa será cumprida.

São só memórias, xis... são... tudo isso.
Que a sua vida tenha sido plena, e que te baste o amor dos teus.
Anoiteço com essa noite, que é escura e sem estrelas, pra amanhecermos todos juntos, numa próxima vez.

(essas lágrimas que me lavam o rosto, eu não consigo calar.)